21/12/2024

Mundo, espaço e lugar: uma crítica à interpretação da teoria dos dois mundos atribuída a Platão

Este livro argumenta contra a interpretação da “teoria dos dois mundos” imputada à filosofia de Platão. A diferenciação entre δ?ξα e ?πιστ?μη no final do livro V da República não promove uma separação de duas totalidades ou dois mundos opostos, o mundo inteligível e o mundo sensível. A partir do discurso no Timeu sobre a geração do κ?σμος (27c-40d), em particular a introdução do ser vivo inteligível como modelo do mundo, e do discurso sobre o terceiro gênero, o “espaço” (χ?ρα) (47e-61c), mostramos que a teoria dos dois mundos se choca contra a postulação da unidade do κ?σμος e as reflexões platônicas sobre τ?πος e χ?ρα em ambos os diálogos, particularmente no Timeu. A análise dos significados de “mundo” e de “espaço-lugar” renovará algumas questões inerentes à teoria das Formas inteligíveis e um esboço da história da teoria dos dois mundos mostrará de que modo essa interpretação foi projetada sobre a filosofia de Platão. A difundida interpretação da “teoria dos dois mundos” não corresponde à essência do pensamento de Platão, ao contrário do que se acredita. Essa interpretação não pressupõe uma consideração satisfatória do que significa “mundo” propriamente e vai contra uma análise mais detida da filosofia dos diálogos, não apenas contra a ontologia e a epistemologia das obras, mas contra os princípios básicos da cosmologia e da topologia platônicas. De saída, será crucial um estudo sobre as definições, as origens, os pressupostos e implicações da teoria dos dois mundos, pois, apesar da disseminação da interpretação, podemos notar vaguezas, incoerências e lacunas em seus pressupostos e métodos usuais de análise. O livro apresenta e discuti as críticas ontológicas-epistemológicas dirigidas à teoria dos dois mundos por G. Fine, F. Gonzalez e M. Marques, entre outras, às quais somos favoráveis, e propõe que esse viés standard seja enriquecido e complementado pelo estudo dos conceitos (assim como as metáforas e as imagens) de “mundo” e de “espaço-lugar”. O livro recoloca as questões sobre o que é a teoria dos dois mundos, o que é mundo e o que é espaço-lugar, para mostrar que, apesar da história da teoria dos dois mundos e de sua ampla aceitação entre os estudiosos, imagens e conceitos fundamentais do pensamento platônico explícitos no Timeu contrariam frontalmente a suposição da existência de dois mundos separados e opostos. Destaca-se, em especial o princípio da unicidade do κ?σμος e a teoria do espaço-lugar em Platão, cuja análise ilustrará nuanças cruciais na noção de “separação”, que o âmbito do vir a ser e da sensibilidade não é irreal ou menos real e que a ontologia platônica mantém um princípio unificador no qual a heterogeneidade dos gêneros ou dos τ?ποι sensível e inteligível é afirmada num contexto dialético de reconhecimento das complexidades e integração das diferenças entre o que aparece e o que é inteligido. A partir disso, contra a opinião predominante, olivro defende a ideia de que não há dois mundos na filosofia platônica, e sim dois (ou mais) aspectos ou eventualmente graus de determinação distintos de um único mundo.

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