"Entre o Absurdo e a Revolta"

V.18 N.1 (2021): Inverno de 2021 • Kalagatos - Philosophical Journal

Autor: Debora Maria dos Santos

Resumo:

Entre o absurdo e a revolta - Por uma proposta filosófica para o ensino de filosofia pensada a partir de Albert Camus é um livro inovador por ser justamente uma pesquisa sobre Camus aplicada ao ensino. Nisso, Danilo Rodrigues Pimenta coloca em exercício o existencialismo camusiano como uma prática pedagógica, a partir dos princípios do absurdo e da revolta.

O livro se divide em três partes, a primeira delas, "filosofia e existência: os pilares do pensamento filosófico camusiano" explica o alinhamento de Camus com as premissas do existencialismo, mas não com as conclusões dos seus contemporâneos. Isso, por si só, já faz de Camus um pensador singular à medida em que se recusa a uma prática profissional ou "professoral" da filosofia. Entender, assim, o âmbito do ensino da filosofia camusiana num primeiro princípio está ligado ao estranhamento com a existência, interrogando a razão profunda de existir e o sentimento absurdo que reveste a condição humana. O absurdo é a própria contradição que deve ser entendida como método e não como doutrina de ensino.

Na segunda parte do livro "O existir ético de Albert Camus", surge o problema do suicídio como investigação fundamental da filosofia. A fuga, a evasão enquanto negação de si é uma atitude que se contrapõe à revolta, à liberdade e à paixão de viver e de fazer viver o absurdo. O fracasso do suicídio, seja ele teológico, filosófico ou existencial, é o entendimento de que saltos não salvam a iminente gravidade subsequente da queda. Nisso, Camus é certeiro em criticar Jaspers, Chestov, Kierkegaard e Husserl como filósofos de saltos e o livro de Danilo Pimenta explica de maneira didática ponto por ponto dessa crítica. Para prosseguir, resta a solidariedade, não da revolução como busca da unidade, mas a revolta do presente, da solidariedade de que nós somos porque existimos contra as tiranias metafísicas e políticas, recusando a liberdade absoluta e assumindo os limites do próprio absurdo.

Na terceira parte "A existência filosófica e ensino filosófico", chegamos, então, à relação do absurdo com o ensino de filosofia, primeiramente assumindo que não há separação entre vida e obra. O autor analisa brevemente a história do fenômeno universitário da filosofia no Brasil e entende que a iniciação ao filosofar pela perspectiva camusiana também é marcada pelo suicídio filosófico no contexto brasileiro. Visto que há um desestimulo para as reflexões pessoais em prol da história da filosofia, além de, é claro, uma falta de enfrentamento à tradição em dogmatizar o professor/investigar à "peste do comentador". Isto é, em outras palavras, o absurdo da fratura entre homem e o mundo, na fragmentação entre o ensino de filosofia e a ação de filosofar e pensar singularmente.

O autor propõe então uma iniciação autônoma à vida criativa, no despertar da consciência existencial contra o automatismo e rumo ao dilema do heterocídio e do parricídio. Ou seja, nisso vemos aí o caráter inovador do trabalho ao trazer esse neologismo conceitual que explica como a negação do presente se dá por uma promessa de um destino utópico para o estudante de filosofia. E isso ocorre justamente por uma ausência do parrícidio por parte dos estudantes, que não se desapegam dos seus mestres, sejam os teóricos como os orientadores práticos, até porque, a academia com sua arrogância conversadora, não aceita essa heterodoxia. A própria estrutura stricto sensu da academiaé uma espécie de trilha filosófica estreita na qual "um salto" pode levar tudo a perder, ou seja, um paradoxo ou talvez, em palavras camusianas: um absurdo.

O autor relembra, então, que a tendência natural humana ao filosofar deve se nortear pela curiosidade de existir. As perguntas existenciais são sempre um centro que nos permitem refletir a nossa vivência em solidariedade com o fato de que nós somos todos humanos, buscando viver, seja aluno ou professor, da melhor maneira o desenvolvimento livre e criativo de nossa autonomia. Para isso, a leitura do presente livro é eminentemente um excelente exercício. 

 

ISSN: e-ISSN: 1984-9206

Texto Completo: https://revistas.uece.br/index.php/kalagatos/article/view/7289/6152

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