Neoliberalismo autoritário: A racionalidade que gerou o bolsonarismo

Dalmo Buzato

Linguista e pesquisador na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Thomaz de Castro

Doutorando pela UFMG; professor e pesquisador de Comunicação Social.

25/09/2024

de Alisson Diego Moraes (Editora Dialética, 2023) | Link para compra

Nesta resenha apresentamos o livro “Neoliberalismo autoritário: a racionalidade que gerou o bolsonarismo”, de Alisson Diego Moraes, lançado pela Editora Dialética em 2023, obra que resulta da dissertação de mestrado em Ciências Sociais pela PUC-MG do autor. Trata-se de uma análise das potenciais relações entre tendências autoritárias e o neoliberalismo no Brasil da última década. Digna de nota é a experiência pessoal do autor, político mineiro com duas décadas de experiência na gestão pública, além de intelectual comprometido com a reflexão sobre as características da política brasileira contemporânea.

A inquietude do autor com as jornadas de junho de 2013 e a sua vivência como ator executivo político levaram-no a adentrar as nuances do neoliberalismo à brasileira, que por sua vez converge frontalmente com o histórico autoritarismo nacional, que reúne racionalidade econômica e militarismo para garantir a implantação do regime neoliberal enquanto projeto de estruturação da sociedade: esta conjunção de variáveis é histórica na América Latina, indo do advento da experiência chilena com Pinochet até o momento presente, e pré-condição para o bolsonarismo, que representa um movimento político autoritário convergente com os aparelhos de segurança formais (forças armadas e policiais) e informais (milícias e a Bancada da Bala) no Congresso Nacional – observado também a articulação destas com os setores conservadores, religiosos e ligados ao agronegócio.

Logo, o objetivo central dessa obra é analisar quais e como se dão, no Brasil, as conexões sociopolíticas e ideológicas entre o neoliberalismo e o autoritarismo, e como esse somatório se condensa na figura de Bolsonaro, que se viabiliza pelo processo histórico global de esgarçamento das instituições democráticas a partir de dentro, sem rupturas violentas como a de 1964 (ainda que esteja em curso um processo judicial para apurar a culpabilidade dos envolvidos com a ‘Minuta do Golpe’ de 2022) e amplamente apoiado nos meios digitais para conectar o líder aos seus apoiadores. E, para tanto, o autor explora o neoliberalismo e seus veios autoritários no Brasil desde seu nascedouro e passando por um panorama histórico dos governos iniciais da Nova República, o governo FHC e o neodesenvolvimentismo dos quase 16 anos do PT, para enfim culminar na expressão do neoliberalismo autoritário por meio do golpe de Dilma Rousseff e seus desdobramentos na eleição de 2018.

Portanto, o autoritarismo pragmático neoliberal vem se instalado com a garantia de supostos benefícios imediatos materiais difusos em toda a sociedade, baseado num populismo (entendido, grosso modo, como uma redução da política a um discurso de dualismo entre um povo versus uma elite corrupta) que corrói a democracia liberal e combate a mediação das instituições e do ordenamento jurídico com o cidadão, de forma oportunista para suas causas e dizendo advogar legitimamente por uma suposta autêntica vontade popular. Esses partidos têm conseguido na atualidade o aporte de parte do centro ideológico, e pesquisas em seis países sugerem que os eleitores jovens consideram menos essencial “viver numa democracia” do que obter as condições imediatas de sobrevivência diante de cenários de desemprego, crise do bem estar social e das políticas sociais como um todo, dentre outros fatores, que no conjunto condensam as frustrações com a representação política inerente à democracia liberal.

Resta inexorável a conclusão de que vivemos um retrocesso democrático potencializado pelas novas tecnologias que promovem comunicações a um só tempo massificadas e desreguladas, operando não só na brecha da lei como também à margem dessa quando existe. Portanto, a reflexão promovida por esta obra é bastante relevante por se encaixar no cenário atual de participação de figuras autoritárias, populistas e neoliberais não só no Brasil como em todo o mundo, ainda que focada na transformação histórica do pensamento reacionário nacional, que estará na arena quando das eleições municipais desse ano de 2024.